Aos 70 anos, Nescau perde espaço para concorrentes
Valor Econômico
"Desde minha infância tenho sido consumidor de achocolatados. Tomava Nescau. Aí, Nescau mudou a fórmula e passei a tomar Toddy. Toddy mudou a fórmula e passei para o Muky. Depois fui para o Mágico e Nescau de novo. Toddy de novo. Nescau de novo. Até que comecei a tomar Ovomaltine. Não sei mais que marca experimentar", diz Marcelo Colmenero, 25 anos, profissional de marketing, de São Paulo.
Assim como ele, milhares de consumidores de achocolatados estão órfãos da marca mais tradicional, o Nescau. Falar em milhares não é exagero. Só no Orkut, o site de relacionamentos mais popular no Brasil, há mais de mil fóruns de discussão dedicados ao produto. No maior deles, estão listadas 63.291 pessoas. E a maioria discute um só assunto: a mudança de Nescau e a insatisfação que isso gerou. Por mais prosaico que possa parecer, a discussão revela um marco na trajetória de um produto com 70 anos de mercado: pela primeira vez, Nescau perde terreno.
Há cinco anos, segundo Ivan Zurita, presidente da Nestlé no Brasil, Nescau tinha 65% do consumo nacional em um mercado que movimenta anualmente R$ 2 bilhões. É tanto achocolatado que a marca se tornou a segunda mais consumida do mundo, segundo o instituto Europanel, mesmo sendo vendida só no Brasil. Hoje, entretanto, sua participação caiu para 59%. O produto ainda é líder, mas tem dado chance para a concorrência crescer.
De 2003 para cá, novas marcas e embalagens vêm surgindo e conquistando o gosto do consumidor. Uma delas é o Palate, que apesar de ter 57 anos de mercado, só agora ganha expressividade. "No interior de São Paulo e no litoral já temos 11% das vendas", diz Martin Afonso de Souza Bueno, principal executivo da CBA, empresa que fabrica o achocolatado e fornece cestas básicas a outras empresas. Segundo Bueno, o segmento de achocolatados ficou mais disputado porque a percepção de qualidade do consumidor em relação às marcas concorrentes melhorou. "Como muita gente ficou descontente com a marca mais tradicional, o consumidor começou a experimentar o que mais havia na prateleira", explica.
Nelson Adail Putti, diretor de vendas de mercado interno da Da Barra, dona da marca Achocolatado Da Barra, concorda. "Os consumidores estão menos fiéis", afirma ele, apesar de muita gente ainda usar o nome Nescau ou Toddy como sinônimo de achocolatado. No Brasil, 87% dos consumidores compra achocolatados regularmente.
Nessa onda de experimentação, outro achocolatado que ganhou pontos foi o centenário Ovomaltine. A embalagem cor de laranja quase sumiu do varejo no início da década. Mas a maré virou quando, em 2002, a marca foi comprada pela Associated British Foods. "No ano passado começamos a receber mais recursos da matriz e no início deste ano fechamos uma nova parceria de distribuição com a Bauducco", diz Danilo Nogueira, responsável pelo negócio de Ovomaltine da ABF na América Latina. Com isso, as vendas já cresceram neste ano, até abril, 42% em relação a igual período de 2007 e, Ovomaltine, que tinha menos de um ponto percentual de participação no mercado agora já tem 2% nacionalmente.
Também ganharam pontos as marcas mais baratas, chamadas de "low price" (preço baixo, em inglês). A maioria diminuiu o preço de seu achocolatado trocando a embalagem da lata ou do pote plástico pelo pacote, chamado de sachê. "Hoje, o sachê já tem um terço das vendas de achocolatados no país", diz Moisés Carlos Ferreira, da CBA.
Nescau, segundo a análise de seus concorrentes, ficou parado enquanto todo mundo se mexia. Só agora, dois anos depois da concorrência, está partindo para a embalagem sachê. "Enquanto o consumidor pedia mais chocolate, o Nescau entregava novas formulações, como a 2.0 e a Power, que tinham milhares de componentes, mas pouco sabor de achocolatado", disse um produtor concorrente. A Nestlé, consultada pelo Valor, preferiu não comentar o assunto.
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