A queda do dólar e os altos cachês das celebridades brasileiras
Por Eliane Sobral
EXAME
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O uso de celebridades em propaganda é um dos recursos mais antigos e — dizem — eficazes para vender um produto. A fórmula, de tão simples, mudou muito pouco nos últimos 100 anos: escolhe-se uma personalidade com grande empatia entre os consumidores e trata-se de associar suas qualidades à marca ou ao produto anunciado. Uma boa medida de quanto essa velha estratégia ainda funciona no Brasil é o valor dos cachês publicitários de celebridades. Estrelas como a cantora Ivete Sangalo não saem de casa por menos de 2 milhões de reais. Astros do escalão imediatamente inferior, como o ator Selton Mello, cobram cerca de 1 milhão de reais por campanha, enquanto Wagner Moura (celebrizado como o truculento e carismático capitão Nascimento, de Tropa de Elite) e Lázaro Ramos têm, respectivamente, cachê de 600 000 e 400 000 reais. São valores altos, uma vez que a média do mercado fica em torno de 250 000 reais de cachê para uma celebridade-padrão. Com a recente desvalorização do dólar — 16% no ano passado e outros 6% apenas nos quatro primeiros meses deste ano —, ocorreu um fenômeno incomum no mercado brasileiro: os cachês das celebridades nacionais de primeiro time equipararam-se aos cobrados por estrelas de Hollywood. Hoje, é possível contratar famosos internacionais pelo mesmo preço que se pagaria aos brasileiros — às vezes, até menos (veja quadro). “Além do câmbio, o Brasil é hoje um país cada vez mais internacional”, diz Nizan Guanaes, presidente da agência Africa.
Essa súbita mudança já pode ser vista nas campanhas publicitárias brasileiras. Desde julho, pelo menos cinco estrelas do primeiro time de Hollywood protagonizaram anúncios criados por agências brasileiras para ser veiculados no mercado nacional. A última delas foi a atriz americana Sarah Jessica Parker, estrela da série e do filme Sex and the City, que estreou recentemente em São Paulo. Sarah estrela a campanha de lançamento do Shopping Cidade Jardim, recém-inaugurado em São Paulo e voltado para o comércio de alto luxo. Para gravar o comercial em Nova York, onde aparece passeando com as sacolas estampadas com o logotipo do shopping, Sarah cobrou 600 000 dólares, metade do que cobra a diva do axé Ivete Sangalo. “Sarah é a estrela que melhor simboliza o conceito do novo shopping: uma idéia de sofisticação e de absoluta identificação com o mundo das grifes”, diz Gal Barradas, vice-presidente de propaganda da MPM, agência que criou a campanha. O próprio filme Sex and the City já é considerado um dos maiores fenômenos de merchandising da história do cinema. Segundo um levantamento da revista americana Vanity Fair, o filme exibe 25 grifes de roupas e sapatos, oito redes de varejo, sete marcas de aparelhos eletrônicos e artigos domésticos, sete de alimentos e cinco de produtos de higiene pessoal. Algumas das marcas que aparecem no longa-metragem, como Chanel, Swarovski e Tiffany & Co., têm lojas no novo shopping paulistano.
Vantagens financeiras à parte, o uso de celebridades internacionais traz outros dois grandes benefícios aos anunciantes. O primeiro é o distanciamento em relação a campanhas que usam atores, cantores e esportistas brasileiros. Conhecida entre os publicitários pelo nome de campanha testemunhal, essa categoria de propaganda incorre no risco de superexposição de suas estrelas, que normalmente aproveitam os momentos de maior visibilidade e popularidade para explorar o máximo possível sua presença em publicidade. Isso aconteceu recentemente com a modelo Gisele Bündchen e volta a se repetir com Ivete Sangalo. Nos últimos seis meses, a cantora baiana estrelou campanhas da Philips, da marca de tinturas para cabelos Garnier, da cerveja Nova Schin e de sandálias da Grendene. Apesar de ser produtos diferentes, a ubiqüidade do garoto-propaganda pode causar associações indesejáveis para os anunciantes. “Tem artista que anuncia tanta coisa ao mesmo tempo que fica difícil identificá-lo com sua marca”, diz Alexandre Filizola, vice-presidente de atendimento da agência McCann Erickson. Responsável pela conta de publicidade da GM do Brasil, a McCann optou por não correr esse risco e contratou uma estrela internacional para anunciar uma nova versão de luxo do modelo Vectra da montadora. O escolhido foi o ator irlandês Pierce Brosnan, que estrelou quatro filmes do agente secreto 007, entre 1995 e 2002. Brosnan passou três dias no Brasil e recebeu cachê de 400 000 dólares, o mesmo que cobra, por exemplo, o ator Rodrigo Santoro. “Dificilmente vamos ver o Pierce Brosnan anunciando coisas como apartamentos ou cerveja no Brasil”, diz Filizola.
O segundo benefício das celebridades estrangeiras é a inevitável curiosidade em torno do comercial em si — o que os especialistas chamam de buzz marketing. Tome-se o exemplo de Sarah Jessica Parker. Antes mesmo de a campanha do Shopping Cidade Jardim estrear, em 31 de maio, fotos da atriz gravando em Nova York e notícias sobre as filmagens foram publicadas em colunas sociais e em revistas de celebridades. Em julho, quando o ator Kiefer Sutherland, protagonista da popularíssima série 24 Horas, esteve no Brasil para gravar um anúncio para o lançamento do modelo C4 Pallas, da Citroën, o barulho foi ainda maior. Por um cachê de 1 milhão de dólares, Sutherland, além de gravar o filme, participou de festas patrocinadas pela empresa, deu entrevistas e distribuiu autógrafos em profusão. Ao todo foram publicados na imprensa brasileira 156 artigos e notas e 225 fotos sobre a presença e o trabalho do astro no país. Se fosse pagar por toda essa publicidade indireta, a Citroën teria investido algo próximo a 4,4 milhões de reais, segundo Duílio Malfatti, presidente da Euro Brasil, agência de publicidade da empresa. “Claro que tivemos toda essa repercussão porque se tratava de um astro internacional no auge do sucesso”, diz Malfatti.
Inflação verde-amarela
Cachês cobrados por celebridades nacionais e internacionais (em dólares)
Gisele Bündchen
1 300 000
Ivete Sangalo
1 250 000
Kiefer Sutherland
1 000 000
Selton Mello
625 000
Sarah Jessica Parker
600 000
Rodrigo Santoro
400 000
Pierce Brosnan
400 000
Wagner Moura
375 000
Richard Gere
300 000
Lázaro Ramos
250 000
Fonte: mercado publicitário
Antes de fechar com Sutherland, Malfatti pesquisou uma lista com 20 candidatos à vaga de garoto-propaganda da Citroën — nenhum deles brasileiro. Entre outros, concorriam os atores Bruce Willis e George Clooney — o primeiro descartado por falta de agenda e o segundo pelo cachê pedido: 2 milhões de dólares. Apesar do enorme sucesso decorrente da passagem de Sutherland pelo Brasil, a campanha, que estreou em agosto, sofreu as conseqüências do mau comportamento de seu protagonista — talvez o maior dos riscos em estratégias desse tipo. Em setembro, Sutherland foi preso em Los Angeles por dirigir alcoolizado. “Foi um problema sério, mas, como aconteceu nos Estados Unidos, afetou pouco a imagem do ator no Brasil”, diz Malfatti. Em outubro de 2005, a rede de joalherias brasileira H.Stern abortou uma campanha de 3 milhões de dólares em que comemoraria 80 anos de fundação depois que a estrela contratada para os comerciais, a modelo inglesa Kate Moss, foi fotografada consumindo cocaína durante um ensaio da banda de rock de seu namorado. Recentemente, o envolvimento do jogador Ronaldo com travestis no Rio de Janeiro provocou mal-estar entre seus patrocinadores, TIM, Ambev e Nike. Essas empresas não rescindiram o contrato com o atleta, mas foram forçadas a colocá-lo na “geladeira”. Nesses casos, não há muito mesmo o que fazer, a não ser esperar o tempo passar e o episódio cair no esquecimento público.
Essa súbita mudança já pode ser vista nas campanhas publicitárias brasileiras. Desde julho, pelo menos cinco estrelas do primeiro time de Hollywood protagonizaram anúncios criados por agências brasileiras para ser veiculados no mercado nacional. A última delas foi a atriz americana Sarah Jessica Parker, estrela da série e do filme Sex and the City, que estreou recentemente em São Paulo. Sarah estrela a campanha de lançamento do Shopping Cidade Jardim, recém-inaugurado em São Paulo e voltado para o comércio de alto luxo. Para gravar o comercial em Nova York, onde aparece passeando com as sacolas estampadas com o logotipo do shopping, Sarah cobrou 600 000 dólares, metade do que cobra a diva do axé Ivete Sangalo. “Sarah é a estrela que melhor simboliza o conceito do novo shopping: uma idéia de sofisticação e de absoluta identificação com o mundo das grifes”, diz Gal Barradas, vice-presidente de propaganda da MPM, agência que criou a campanha. O próprio filme Sex and the City já é considerado um dos maiores fenômenos de merchandising da história do cinema. Segundo um levantamento da revista americana Vanity Fair, o filme exibe 25 grifes de roupas e sapatos, oito redes de varejo, sete marcas de aparelhos eletrônicos e artigos domésticos, sete de alimentos e cinco de produtos de higiene pessoal. Algumas das marcas que aparecem no longa-metragem, como Chanel, Swarovski e Tiffany & Co., têm lojas no novo shopping paulistano.
Vantagens financeiras à parte, o uso de celebridades internacionais traz outros dois grandes benefícios aos anunciantes. O primeiro é o distanciamento em relação a campanhas que usam atores, cantores e esportistas brasileiros. Conhecida entre os publicitários pelo nome de campanha testemunhal, essa categoria de propaganda incorre no risco de superexposição de suas estrelas, que normalmente aproveitam os momentos de maior visibilidade e popularidade para explorar o máximo possível sua presença em publicidade. Isso aconteceu recentemente com a modelo Gisele Bündchen e volta a se repetir com Ivete Sangalo. Nos últimos seis meses, a cantora baiana estrelou campanhas da Philips, da marca de tinturas para cabelos Garnier, da cerveja Nova Schin e de sandálias da Grendene. Apesar de ser produtos diferentes, a ubiqüidade do garoto-propaganda pode causar associações indesejáveis para os anunciantes. “Tem artista que anuncia tanta coisa ao mesmo tempo que fica difícil identificá-lo com sua marca”, diz Alexandre Filizola, vice-presidente de atendimento da agência McCann Erickson. Responsável pela conta de publicidade da GM do Brasil, a McCann optou por não correr esse risco e contratou uma estrela internacional para anunciar uma nova versão de luxo do modelo Vectra da montadora. O escolhido foi o ator irlandês Pierce Brosnan, que estrelou quatro filmes do agente secreto 007, entre 1995 e 2002. Brosnan passou três dias no Brasil e recebeu cachê de 400 000 dólares, o mesmo que cobra, por exemplo, o ator Rodrigo Santoro. “Dificilmente vamos ver o Pierce Brosnan anunciando coisas como apartamentos ou cerveja no Brasil”, diz Filizola.
O segundo benefício das celebridades estrangeiras é a inevitável curiosidade em torno do comercial em si — o que os especialistas chamam de buzz marketing. Tome-se o exemplo de Sarah Jessica Parker. Antes mesmo de a campanha do Shopping Cidade Jardim estrear, em 31 de maio, fotos da atriz gravando em Nova York e notícias sobre as filmagens foram publicadas em colunas sociais e em revistas de celebridades. Em julho, quando o ator Kiefer Sutherland, protagonista da popularíssima série 24 Horas, esteve no Brasil para gravar um anúncio para o lançamento do modelo C4 Pallas, da Citroën, o barulho foi ainda maior. Por um cachê de 1 milhão de dólares, Sutherland, além de gravar o filme, participou de festas patrocinadas pela empresa, deu entrevistas e distribuiu autógrafos em profusão. Ao todo foram publicados na imprensa brasileira 156 artigos e notas e 225 fotos sobre a presença e o trabalho do astro no país. Se fosse pagar por toda essa publicidade indireta, a Citroën teria investido algo próximo a 4,4 milhões de reais, segundo Duílio Malfatti, presidente da Euro Brasil, agência de publicidade da empresa. “Claro que tivemos toda essa repercussão porque se tratava de um astro internacional no auge do sucesso”, diz Malfatti.
Inflação verde-amarela
Cachês cobrados por celebridades nacionais e internacionais (em dólares)
Gisele Bündchen
1 300 000
Ivete Sangalo
1 250 000
Kiefer Sutherland
1 000 000
Selton Mello
625 000
Sarah Jessica Parker
600 000
Rodrigo Santoro
400 000
Pierce Brosnan
400 000
Wagner Moura
375 000
Richard Gere
300 000
Lázaro Ramos
250 000
Fonte: mercado publicitário
Antes de fechar com Sutherland, Malfatti pesquisou uma lista com 20 candidatos à vaga de garoto-propaganda da Citroën — nenhum deles brasileiro. Entre outros, concorriam os atores Bruce Willis e George Clooney — o primeiro descartado por falta de agenda e o segundo pelo cachê pedido: 2 milhões de dólares. Apesar do enorme sucesso decorrente da passagem de Sutherland pelo Brasil, a campanha, que estreou em agosto, sofreu as conseqüências do mau comportamento de seu protagonista — talvez o maior dos riscos em estratégias desse tipo. Em setembro, Sutherland foi preso em Los Angeles por dirigir alcoolizado. “Foi um problema sério, mas, como aconteceu nos Estados Unidos, afetou pouco a imagem do ator no Brasil”, diz Malfatti. Em outubro de 2005, a rede de joalherias brasileira H.Stern abortou uma campanha de 3 milhões de dólares em que comemoraria 80 anos de fundação depois que a estrela contratada para os comerciais, a modelo inglesa Kate Moss, foi fotografada consumindo cocaína durante um ensaio da banda de rock de seu namorado. Recentemente, o envolvimento do jogador Ronaldo com travestis no Rio de Janeiro provocou mal-estar entre seus patrocinadores, TIM, Ambev e Nike. Essas empresas não rescindiram o contrato com o atleta, mas foram forçadas a colocá-lo na “geladeira”. Nesses casos, não há muito mesmo o que fazer, a não ser esperar o tempo passar e o episódio cair no esquecimento público.
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