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segunda-feira, 6 de agosto de 2007

Atacado reage à venda direta da indústria ao "varejinho"

Valor Econômico
"Nenhuma empresa é capaz de atender o mercado brasileiro sozinha, sempre será preciso um intermediário. Por mais que as indústrias estejam fazendo experiências com a venda direta ao pequeno varejo, elas não têm capacidade para isso. Os fornecedores que insistirem com essa prática vão ver atacadistas e distribuidores fechando parceria com os concorrentes deles para conquistar a fidelidade dos lojistas. Não somos mais o velho atacado da época da inflação". O desabafo em tom de ameaça é de Geraldo Caixeta, presidente da Associação Brasileira de Atacadistas e Distribuidores (Abad). O empresário, dono da União Atacado Distribuidora - que atua em 16 Estados e faturou R$ 340 milhões em 2006 -, vem sentindo a crescente pressão da indústria para chegar direto aos varejistas de pequeno porte, substituindo em parte o trabalho do setor de atacado distribuidor.
Segundo pesquisa da Abad encomendada à Latin Panel, no espaço de apenas um ano - entre o primeiro semestre de 2006 e os primeiros seis meses de 2007 -, caiu de 23% para 8% o número de varejistas que comprava quase todo o seu estoque com o atacado distribuidor. Por outro lado, quase um terço dos comerciantes está adquirindo mais de 30% do seu mix direto da indústria; no ano passado, isso era feito por 18% deles. "Principalmente os fabricantes de perecíveis, como frios e laticínios, vêm trabalhando intensamente a venda direta ao pequeno varejo", diz Fátima Merlin, gerente da Latin Panel, responsável pelo estudo.
Atacadistas e distribuidores não estão dispostos a ver o cenário piorar e contra-atacam. Procurando intensificar o relacionamento com o seu principal cliente, o "varejinho" - formado por padarias, mercearias, bares, farmácias e supermercados de até quatro check-outs -, o setor está oferecendo desde pagamento de contas e recarga de celular nas suas lojas até cursos de gestão, com direito à consultoria no ponto-de-venda do cliente. É o caso de atacadistas como o Roldão, que abandonou a parceria com a Fininvest para lançar o seu próprio cartão de crédito, e da EBC, dona das lojas de cosméticos Ikesaki, que oferece treinamento em vendas aos lojistas.
"Queremos entender melhor essa clientela e estreitar o nosso relacionamento", diz Caixeta. Há boas razões para isso. Embora o tíquete médio do "varejinho" seja de apenas R$ 9 (contra R$ 21 do auto-serviço), o número de visitas mensais do consumidor a estes estabelecimentos é mais do que o triplo da quantidade de idas aos super e hipermercados - uma relação de 13 para 4. Quase um terço (31%) das lojinhas recebe mais de 200 clientes por dia e 66% fazem compras semanais, segundo a pesquisa da Latin Panel, que está sendo apresentada hoje em Recife (PE), na 27ª convenção anual da Abad.
E é justamente nestes pontos-de-venda estratégicos que a indústria investe com a venda direta, feita por equipes próprias ou terceirizadas, em que muitas vezes os distribuidores são aproveitados como operadores logísticos, restritos à entrega dos produtos. Sem inflação, o consumidor não precisa mais correr para aproveitar as ofertas relâmpago dos super e hipermercados e aumenta a compra na loja do bairro. Com isso, a indústria se empenha em melhorar a apresentação e o preço dos produtos nestes pontos-de-venda, sem a interferência de intermediários.
"Se você embarca em um ônibus, tem que seguir um roteiro pré-determinado; se pega um táxi, pode definir qual é a rota - essa é a diferença entre entregar o seu produto para um atacadista e ensinar o pequeno comerciante a vendê-lo", compara Paulo Fleury, diretor do Centro de Estudos em Logística do Instituto Coppead. Manoel Reis, coordenador do Centro de Excelência em Logística e Cadeias de Abastecimento da Fundação Getúlio Vargas (FGV), explica que a relação da indústria com os distribuidores costuma ser menos tensa do que com os atacadistas. "Em muitos casos, o distribuidor trabalha com exclusividade para o fabricante e segue suas estratégias", diz.
O mesmo não acontece com o atacado, que é independente em sua política de preços. "Em um mundo ideal, não gostaria de trabalhar com atacadistas", diz Amauri Hong, diretor geral da Ever Green, fabricante de produtos de higiene pessoal. "Os distribuidores são essenciais para as estratégias de médio e longo prazo das marcas, mas os atacadistas podem destruir isso ao se focar na venda imediata", afirma. A empresa, de São Bernardo do Campo (SP), com capacidade para produzir 25 milhões de itens por mês, vem ganhando mercado com as próprias marcas de fraldas e absorventes. "Os atacadistas são agressivos e forçam o preço para baixo, o que pode depreciar a imagem do produto na gôndola", diz Hong.
A Abad garante que isso não é a regra. Como prova, fechou uma parceria com o Sebrae nacional para realizar uma série de cursos de capacitação voltados ao pequeno varejo. "A nossa pesquisa identificou que 83% dos pequenos varejistas estão interessados em treinamentos para melhorar a gestão do seu negócio, mas 90% não querem assumir estes custos sozinhos", diz Fátima. No evento em Recife, que vai até o dia 9, a Abad dará início ao primeiro módulo dos cursos, que vão englobar controle financeiro, formação de preços, vendas e merchandising, gestão de pessoas, gerenciamento de estoques e atendimento ao cliente.
Também a EBC está voltada a atender o pequeno varejista de cosméticos com treinamentos. Para isso, aliou-se a grandes fabricantes que não vendem direto ao pequeno varejo, diz o gerente comercial e de marketing da EBC, Murilo Marcacini. "Além dos cursos, vamos dar suporte de campo a 140 lojas", afirma. Já o Roldão lança nesta semana o seu próprio cartão, depois de ter desistido da parceria com a Fininvest. "Havia muitos dogueiros, donos de pizzaria e padaria que tinham condições de obter o cartão, mas eram barrados pela financeira", diz Ana Paula Hass, coordenadora de marketing. A novidade será anunciada aos 35 mil clientes do Roldão, que respondem por um tíquete médio de R$ 85 nas cinco lojas da empresa.

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