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quarta-feira, 24 de junho de 2009

Quão digno é você?

Por Adriano Silva
Há algumas semanas assisti a um filme de terror bem ruizinho, Evocando Espíritos ("Haunting in Connecticut"), acompanhado de um combo gigante de pipoca com refrigerante light (vai entender o paradoxo), que tem uma fala assim: "sua família precisa da sua força, não da sua autocomiseração" - trata-se da mulher (Virgina Madsen, que chegou a ser indicada como Melhor Atriz Coadjuvante por "Sideways", no Oscar e no Globo de Ouro de 2005) falando para o marido bêbado, que perdeu o emprego e que não está mais conseguindo pagar as contas, em especial às do filho doente, que ele não pode jogar a toalha, que é exatamente naquele momento que ela e a família mais estão precisando dele e da sua força. É um filme de 2009 que retrata a família americana média em apuros econômicos (e sobrenaturais!), o que é uma raridade, e talvez a característica mais interessante do filme, estimulada por esses tempos bicudos.

Aquela frase, perdida ali no meio daquele filminho plenamente esquecível, ficou na minha cabeça. É preciso ter dignidade sempre. Dignidade quando se está por cima, quando a fase é boa, quando a vida lhe sorri. Aí a dignidade significa não pisar em ninguém. Significa não humilhar quem pode menos, não machucar com seu sucesso aqueles que tiveram menos êxito, não se imaginar melhor do que os outros só porque a gangorra naquele momento lhe é favorável. Dignidade significa duvidar um pouco dos elogios e dos tapinhas nas costas que recebemos quando tudo dá certo. Não se tornar esnobe, não se deixar seduzir pela soberba, não permitir que a arrogância se instale.

É é preciso ter dignidade também quando se está por baixo. A fase pode ser ruim, a vida pode nos fechar a cara e o céu pode escurecer completamente - nada disso nos dá o direito de agirmos incorretamente, de sermos grosseiros, desrespeitosos, ácidos ou azedos. Ninguém tem que aguentar nosso mau-humor e nosso baixo-astral quando nada dá certo. Ninguém merece uma postura menos honrada ou justa da nossa parte só porque estamos angustiados ou desesperançados. Aí a dignidade significa não agarrar ninguém pelas vestes só porque estamos caindo. Significa não segurar ninguém pelos pés só porque estamos mais abaixo na escada naquele momento. Acuados, deserdados, em maus lençóis, muitas vezes passamos a nos sentir no direito de sair batendo em pessoas que julgamos gozar de uma posição melhor naquele momento. Muitas vezes nos voltamos para o nosso próprio umbigo e nos dedicamos a lamber obscenamente as próprias feridas, ignorando quem mais precisa de nós e da nossa integridade naquele momento. (A começar por nós mesmos.) Dignidade significa nos mantermos coerentes e éticos debaixo do vendaval, no meio da lama, duvidando também daquelas vozes (na maioria das vezes, vozes que só existem dentro da nossa cabeça) que querem nos fazer acreditar que nada, coisa alguma, nunca, jamais voltará a acontecer para a gente.

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