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sábado, 1 de setembro de 2007

"Prato-feito" na padaria cresce e amplia venda da indústria

Valor Econômico

A Euroville está em obras. A padaria instalada há dez anos no bairro da Pompéia, zona oeste de São Paulo, adquiriu o sobrado ao lado, na rua Cotoxó, para aumentar a sua área comercial, que dentro de dois meses ganhará 180 metros quadrados. Hoje, o espaço é muito pequeno para receber parte das 1,8 mil pessoas que visitam o local diariamente, e que precisam disputar uma das 15 mesas disponíveis. Com a nova área, serão 45 mesas, com capacidade para 98 pessoas. O sucesso do negócio, porém, não vem de pãezinhos, bolos ou croissants. O produto que mais tem aumentado o lucro da Euroville e de muitas padarias brasileiras é o popular "PF", ou "prato-feito".
"Cerca de 60% do meu faturamento vêm da copa, com a venda de almoço, pizzas, lanches e petiscos no 'happy hour'", diz o sócio da Euroville, Roberto Simões Fernandes. Na loja, o cliente tem a opção de escolher o prato do dia ou se servir no bufê de saladas, que ganha acompanhamentos como filé mignon e salmão. "Com essa onda de comida light, o pedido que mais sai é a salada com filé de frango e queijo branco", diz Fernandes, filho de dono de padaria, que desde os 16 anos trabalha no ramo. Hoje, aos 44, ele nunca viu tanta freguesia para refeição. "O pessoal quer comer bem por um preço justo", diz ele, que cobra em torno de R$ 13 por prato e vende 80 ao dia. Só de pizzas, serve 90 diariamente.
As padarias decidiram tirar vantagem do crescente negócio da alimentação fora do lar ( ou food service), um mercado ancorado na estatística de que uma a cada quatro refeições do brasileiro é realizada na rua. A expectativa das indústrias alimentícias para este ano é que o food service fature R$ 47,6 bilhões, uma alta de 10% sobre 2006. Do lado das padarias, a oferta do prato-feito é uma saída à pesada concorrência feita nos últimos anos pelos super e hipermercados, que atraíram o consumidor com o pãozinho barato e a diversidade de itens de panificação. Mais comum nos grandes centros, o movimento de adaptar as padarias para servir refeições vem ganhando também o interior do país.
A indústria de alimentação fora do lar fatura alto com o serviço. Segundo levantamento da Associação Brasileira da Indústria Alimentícia (ABIA), feito com exclusividade para o Valor, as padarias já representam 18% da receita do food service, um crescimento de cinco pontos percentuais em relação à fatia de 13%, em 2001. Nesse período, as vendas para as "padarias-restaurantes" saltaram 142%, passando de R$ 3,3 bilhões para R$ 8 bilhões. Trata-se de um crescimento superior ao da própria indústria de food service, que de 2001 para 2006 aumentou sua receita em 96%, para R$ 43,4 bilhões.
"Cerca de três mil padarias ao ano estão se adaptando para oferecer refeições", diz Amilcar Lacerda de Almeida, gerente do departamento de economia, estatística e planejamento da ABIA. Este movimento tem sido mais acentuado nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Rio Grande do Sul, diz ele. "A transformação da padaria em restaurante já atingiu o ápice nas metrópoles e nos últimos dois anos vem se estendendo para o interior desses Estados", afirma.
A Sadia tem na ponta do lápis o número de "padarias-restaurantes" onde pretende centrar esforços: 3,9 mil, espalhadas em todo o país. "Trata-se de um ponto-de-venda que precisou se reinventar na última década e se tornou também restaurante, o que vem ampliando nossa clientela", diz Ely Mizhari, gerente nacional de food service da Sadia, que acaba de pesquisar os pontos já adaptados.
"Cerca de três mil padarias ao ano estão se adaptando para oferecer refeições", diz Almeida, da ABIA
Tanto Sadia, quanto Perdigão, Cargill, Bunge e Unilever tratam o assunto como estratégico, sem revelar quanto as padarias significam do negócio. A disputa promete, já que raramente uma padaria concede exclusividade a um fornecedor do ramo alimentício.
As indústrias mantêm equipes exclusivas para trabalhar a venda no mercado de food service. Segundo Mizhari, da Sadia, a abordagem da equipe é muito mais focada. "Enquanto o pessoal do varejo pergunta ao dono da padaria como estão os estoques de presunto, por exemplo, nosso pessoal procura atender as novas necessidades desse empresário, que deixou de ser padeiro para se tornar um restaurateur", diz ele. Isso significa ajudá-lo a montar um cardápio, desenvolver receitas e ensinar técnicas de segurança alimentar. "É o mesmo treinamento que damos aos restaurantes, lanchonetes, hotéis e cozinhas industriais", afirma.
A atenção concedida pela arqui-rival Perdigão não fica atrás. "Quando o cliente é padaria, nós atendemos qualquer pedido no mesmo dia", diz Marisilda Nabhan Guerra, gerente de food service da empresa. Os clientes de outros pontos-de-venda esperam até 24 horas. A empresa dedica uma parte da sua verba ao marketing, distribuindo cardápios, porta-guardanapos, porta-palitos e jogos de mesa americanos com o logo da Perdigão. "Procuramos também capacitar a mão-de-obra, ensinando a preparar pratos sofisticados, como medalhão de chester", diz.
Na Cargill, a oferta de comida nas padarias aumentou a venda de óleos, gorduras e maionese. Hoje, no grupo dos principais clientes do food service, as padarias representam 15%. "São pontos estratégicos, perto da residência ou do trabalho, e costumam estar em sintonia com o que o consumidor procura", diz Fábio Medeiros, responsável pela área de food service da Cargill, que atende 80% das padarias com venda direta. O restante é feito por distribuidores.
No caso da Josapar, dona do arroz Tio João, toda a venda às padarias é feita por intermediários. "Começamos a atuar no ramo de alimentação fora do lar este ano, mas já temos padarias como clientes indiretos", diz Luciano Targa, gerente nacional de food service da Josapar. Para ir ao pequeno varejo, a empresa conta com distribuidoras como a Tabor, de São Paulo, especializada em food service.
"Por atender a Sara Lee, que é a principal indústria de café do país, já conto com um número expressivo de padarias na minha clientela", afirma Silvio Chagas, diretor geral da Tabor. Segundo ele, são 4,8 mil pontos-de-venda cadastrados, sendo que os ativos - que fizeram compras nos últimos 30 dias - somam 1,2 mil. A "padaria-restaurante" vem significando cada vez mais na receita da distribuidora, que faturou R$ 22 milhões no ano passado. "Há dois anos, este ponto-de-venda representava 20% do meu faturamento e hoje já soma perto de um terço", diz Chagas.
Pesquisa da consultoria ECD, especializada em food service, identificou que a oferta de refeição já é a segunda maior fonte de receita das padarias (28% do faturamento), só perdendo para a panificação (47%). O restante vem da revenda de produtos. "Boa parte das padarias já tem inclusive delivery", diz Enzo Donna, da ECD. Nesse quesito, Belo Horizonte (MG) lidera entre as capitais: 40% da receita vem do serviço de entrega.

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