A baixa renda prefere o torpedo, o meio mais barato
Valor Econômico
Se alguém dissesse, em 1997, que dentro de 10 anos personagens como camelôs, domésticas e pedreiros teriam telefones celulares - um artigo que era então sonho de consumo até para o público de maior renda - ninguém acreditaria. Mas em um País em que 78% da população está nas classes C, D e E, conforme pesquisa Datafolha de 2006, este segmento de mercado encontra maneiras enviesadas de mostrar o seu potencial, que, em alguns casos, pode ser até maior do que o dos consumidores A e B.
Esta é uma das conclusões de uma pesquisa feita pela Latin Panel, que mediu o índice de conectividade do brasileiro, ouvindo quase 20 mil pessoas em todo o País. De acordo com o levantamento, concluído em dezembro, 51% do grupo de consumidores das classes C, D, e E lançam mão de mensagens por celular (torpedos), contra 49% dos usuários das classes A e B que fazem o mesmo.
Há uma razão palpável para explicar esse comportamento: o torpedo custa bem menos do que o minuto do telefone pré-pago, modalidade escolhida por 80,5% da base de 101,2 milhões usuários de celulares no País, justamente por permitir um controle maior dos gastos.
O preço médio de um torpedo é de R$ 0,35 e o minuto num aparelho pré-pago chega a custar R$ 1,60.
"É um alerta às empresas para que sejam desenvolvidos produtos mais baratos, de acordo com a realidade desses consumidores", diz Ulisses Reis, professor do MBA de marketing da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Para ele, da mesma forma que o potencial de consumo de celulares por parte das classes de menor renda foi negligenciado pelas operadoras, a maioria dos anunciantes também ignora que o mundo caminha na direção da inclusão digital.
"Dentro de algum tempo, qualquer espectador poderá acessar, por meio da TV digital, o site da loja de móveis e eletrodomésticos enquanto assiste seu programa de auditório", diz Reis.
A pesquisa da Latin Panel aponta que nas mensagens instantâneas via internet (Messenger) e na comunidade virtual Orkut o número de consumidores das classes C, D e E representa aproximadamente metade dos usuários das classes A e B.
Para o professor Vicente Martin Mastrocola, da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), essa é a maior prova de que as classes de menor renda não vão ficar na era analógica.
"Apesar da evidente diferença de consumo entre os dois públicos, os números indicam que existem um processo de inclusão em curso, que vem sendo favorecido inclusive pelo menor preço dos computadores", diz.
Até o momento, segundo Mastrocola, é o celular quem está fornecendo a maior chance de conectividade para as classes C, D e E. Nesse sentido, diz o professor da ESPM, vale ressaltar ações de "mobile marketing" de marcas como Elma Chips e Pepsi, que realizam promoções do tipo "raspadinha" nos salgadinhos ou refrigerantes, em que o consumidor precisa enviar um torpedo para saber se ganhou um prêmio.
"Além de ter informações importantes sobre o seu público - como o momento em que ele consumiu o produto e em que localidade ele está -, este tipo de ação permite criar um vínculo com o usuário, ao solicitar permissão para enviar mensagens promocionais via torpedos".
Mastrocola também observa que, diferentemente da alta renda, que vê os brindes de salgadinhos como mais um entretenimento que às vezes fica esquecido, as crianças de famílias de baixa renda vão encarar os agrados como um brinquedo, mostrando-se bem mais fiéis à marca.
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